A Voz, a Pena e a Imprensa: Como a Humanidade Guardou Seus Saberes.
Os magníficos desenhos retratados no verso destas três cédulas islandesas nos remetem a forma como as sociedades modernas foram moldadas através da preservação e disseminação de informações, ou seja, a transmissão de conhecimento por via oral, por via manuscrita e por via impressa. A tradição oral foi o principal meio de transmissão de conhecimento nas sociedades pré-literárias. Antes da invenção da escrita, a sabedoria, os costumes, as histórias, os mitos e os conhecimentos práticos eram passados de geração em geração por meio da fala e da memorização. As histórias e conhecimentos orais eram frequentemente adaptados para se ajustarem ao contexto cultural local, refletindo desta forma sua flexibilidade e adaptação. A oralidade também exigia um contato direto entre transmissor e receptor, fortalecendo os laços comunitários. Por outro lado, havia o risco de perda ou distorção, já que o conhecimento transmitido oralmente estava sujeito à variação, esquecimento ou interpretação pessoal. A invenção da escrita, em torno de 3000 a.C., e o desenvolvimento subsequente de materiais para escrita, como papiro, pergaminho e papel, revolucionaram a forma como o conhecimento passou a ser preservado e compartilhado. Manuscritos permitiram que ideias fossem fixadas em um formato duradouro e menos suscetível a alterações. O registro escrito reduziu o risco de distorção e facilitou a preservação de informações ao longo do tempo. Manuscritos podiam ser copiados e transportados, permitindo a disseminação do conhecimento para além das fronteiras locais. Porém havia uma barreira nos primeiros tempos da escrita, já que apenas elites letradas ou classes específicas tinham acesso à leitura e à escrita, criando um monopólio do conhecimento. Um exemplo clássico foram os manuscritos medievais que eram copiados em mosteiros por monges copistas como vemos em uma das cédulas acima. Mas mesmo após o surgimento da escrita, a oralidade continuou sendo um meio vital de transmissão. Muitos textos religiosos ou legais, como a Bíblia ou o Alcorão, foram inicialmente transmitidos oralmente antes de serem registrados. Em várias culturas, o conhecimento escrito foi usado para registrar e validar tradições orais. Por exemplo, as crônicas históricas gregas e romanas frequentemente combinavam relatos orais e registros escritos. Durante períodos como o Renascimento, a recuperação de manuscritos antigos trouxe à tona conhecimentos orais e escritos, integrando ambas as tradições em um esforço conjunto para preservar a herança cultural. Com o advento da imprensa no século XV, mais especificamente a desenvolvida por Gutemberg entre os anos de 1439 e 1440, a transmissão manuscrita começou a declinar, sendo substituída por livros impressos, o que democratizou exponencialmente o acesso ao conhecimento. Contudo, a oralidade permaneceu relevante, especialmente em contextos culturais, educacionais e artísticos, como na música, no teatro e nas narrativas orais. Hoje, a digitalização combina características de ambas as tradições: registros precisos e amplamente disseminados (como textos manuscritos) com dinâmicas interativas e acessíveis (como a oralidade). A comunicação digital passou a ser um elemento central na maneira como as pessoas compartilham informações, interagem entre si e fazem negócios. Como podemos ver, a humanidade passou ao longo de sua história por várias fases na transmissão do conhecimento por ela adquirido: os períodos de oralidade, escrita, imprensa e, finalmente, a era eletrônica. Todas elas se complementaram e desembocaram na complexa e instigante sociedade em que vivemos hoje. E as nossas cédulas, como era de se esperar, contam um pouco desta jornada.
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